Cap 2 - MICELÂNEA
Idéias referentes à salvação
1). Arminianismo
Observando as idéias de Armínio, podemos fazer um esboço
de como ele encara a salvação humana. O primeiro pressuposto
arminiano referente à salvação é a idéia
de que o homem possui livre-arbítrio. Livre-arbítrio significa
que temos arbítrio livre, ou seja, temos liberdade de julgamento,
"a capacidade de escolher nenhuma das opções morais oferecidas
em dada situação. (arbítrio = resolução
que depende só da vontade. Definição do Aurélio).
Então, para que suas criaturas tenham este tipo de liberdade (que
os arminianos consideram a única liberdade genuína), o arminianismo
clássico parte do pressuposto de que Deus precisa limitar Seu poder.
Sendo Ele onipotente, Ele é o único que pode fazê-lo,
e assim o faz para garantir a liberdade de suas criaturas.
Sendo assim, não existe a distinção do chamado geral
da chamada eficaz. Deus chama a todos da mesma forma e cada qual pode responder
positivamente ou não, cabendo ao indivíduo definir seu destino.
Se o homem responder positivamente, ou seja, se ele se converter, ele será
salvo. A conversão consiste de arrependimento e fé. A partir
desta resposta positiva, Deus pode operar a regeneração no
homem. Por isso, Armínio dizia que a vontade humana é uma
das causas da regeneração (ver principais doutrinas nº
15). Veja também que essa é uma das causas de porque ele cria
na expiação universal, pois todos os homens podem responder
positivamente ao chamado e também porque não cria que a graça
de Deus é irresistível.
Após operada a regeneração, o crente ainda assim não
pode ter certeza de sua salvação, porque depende dele perseverar
ou não. Se ele perseverar, terá certeza de que é salvo
e que é um dos escolhidos de Deus (enquanto o homem crê ele
é eleito. Se se desviar e cair, já não é mais
eleito. Mas se porventura se arrepender novamente, será novamente
eleito).O homem só sabe realmente que é um dos eleitos e dos
salvos, depois que morre, porque aí já não pode mais
cair.
Caso o crente regenerado caia, se não se arrepender e voltar novamente,
será condenado eternamente (veja que esta idéia é contrária
até a um dos principais textos usados por Armínio para defender
tal posição ! He 6:4-8).
Podemos então tirar algumas conclusões a respeito do ensino
de Armínio:
- Deus preordena porque prevê e não o contrário.
A base da predestinação é o homem. Deus é
visto como soberano porque criou e mantém o universo, sustentando-o
com a palavra de Seu poder. A soberania específica, ou especial,
está somente sobre a igreja. As outras criaturas são livres
desta soberania, porque são livres e quanto mais liberdade Ele
concede a elas, menos soberano será sobre elas.
- Por causa desta primeira conclusão, observa-se também
que a onipotência é entendida pelo arminianismo, não
no sentido literal de "todo-poderoso", mas no sentido que Deus limita-se
e é todo-poderoso como criador, mas não como executor, a
não ser que suas criaturas o permitam. A idéia correta de
que Deus não pode fazer nada absurdo ou contraditório a
Sua natureza permanece, mas Ele é limitado pelo livre-arbítrio
de suas criaturas livres.
- Há ainda outro tipo de conclusão, como a que chega Clark
Pinnock, que diz que da mesma maneira como Deus limita Seu poder, Ele
limita também Seu conhecimento, pois Ele só pode conhecer
o que pode ser conhecido, não podendo conhecer ações
livres. Assim, Deus tem apenas uma expectativa do que irá acontecer
ou do que pretende fazer, mas não possui certeza até que
isto não se concretize, pois se Deus conhece todas as coisas, até
as ações livres, suas criaturas poderiam fazer apenas aquilo
que Deus pré-conhece, sem poder tomar uma decisão diferente,
o que segundo estes pensadores contraria a própria idéia
de livre-arbítrio. Na verdade, eles não podem ser considerados
como arminianos, pois o arminianismo repousa sobre a pré-ciência,
que faz parte da onisciência definida classicamente como "todo conhecimento".
- A eleição arminiana, como o próprio Wesley define,
não é absoluta e sim condicional. Como Deus vê toda
a eternidade de uma só vez, Ele chama as coisas que não
são, como se fossem. Logo, embora os crentes verdadeiros ainda
não fossem realmente eleitos (pois só o são assim
quando chegam ao céu), Deus os chama de eleitos antes da fundação
do mundo. Só foram feitos eleitos quando foram feitos filhos de
Deus pela fé.
- Veja-se também que a doutrina do livre-arbítrio concorda
com o que Armínio cria a respeito da queda, pois segundo ele herdamos
de Adão apenas a pecaminosidade e a culpa de Adão não
nos é imputada. Assim, somos pecadores porque pecamos. Por isto
explica-se também o ponto 16 e o 17 das doutrinas de Armínio.
(ver principais doutrinas ! pontos 16 e 17).
- Expiação, a morte de Cristo, abre as portas da salvação,
mas não assegura a salvação final de ninguém,
pois esta só será definitiva se crermos e perseverarmos
até nossa morte.
2) Calvinismo
Da mesma forma que os cinco pontos do arminianismo diferem e se afastam
dos cinco pontos do calvinismo, a visão que ambos os sistemas têm
a respeito da salvação também. Note que a diferença
entre os dois não é apenas de ênfase, mas principalmente
de conteúdo. A visão calvinista apóia-se na soberania
e onipotência de Deus, e na depravação total do homem.
Aqui é necessário o entendimento de livre agente. O homem
é um agente livre porque esta é uma característica
com que Deus lhe criou, pois ele pode tomar suas próprias decisões
e tem suas inclinações e pensamentos. Mas note que esta característica
é substancialmente diferente do livre-arbítrio, pois requer
que o homem aja de acordo com sua própria natureza Suas escolhas
são produtos de sua livre ação, mas eles agem de acordo
com sua própria natureza.
Então, agora é necessária a distinção
entre a graça comum e a graça especial. Veja que a graça
de Deus é uma só, mas manifesta-se de duas maneiras diferentes.
A graça comum é aquela que é derramada sobre todos
nós, eleitos ou não. É ela que freia a ação
do pecado e adia o dia do julgamento, enquanto Deus salva seus eleitos.
A expiação relaciona-se com ela, pois a morte de Cristo alcançou
benefícios naturais para todos os homens, trazendo bênçãos
tanto espirituais como materiais, e os não-eleitos participam da
última também. A diferença entre uma e outra se evidencia
em dois pontos, a saber: a graça comum não remove a culpa
do pecado, e ela não suspende a sentença de condenação,
mas unicamente a adia. Neste sentido, a graça comum pode ser resistida.
A graça especial remove a culpa e o pecado interior do homem, mudando
seu coração e sua natureza e esta não pode ser resistida.
Não pode ser resistida, não porque é imposta, mas porque
a natureza humana é mudada. Retira-se o coração de
pedra e coloca-se o coração de carne.
Entendendo estes conceitos, entramos no processo da salvação
propriamente dito. A partir da chamada geral (chamada externa), a pregação
do evangelho aos homens, Deus, através do Espírito Santo,
atua no coração dos seus eleitos, segundo a Sua vontade e
no seu tempo, operando a regeneração, ou seja, a nova vida,
mudando as disposições humanas que antes eram contrárias
a Deus. Agora, o que era indesejável, passa a ser altamente desejável.
Na regeneração, o homem é totalmente passivo, pois
é a obra do Espírito Santo no coração humano.
Tendo recebido os ouvidos espirituais, o chamamento de Deus pelo evangelho
é ouvido agora pelo pecador e é levado efetivamente ao coração,
capacitando-o para compreendê-lo. O desejo de resistir foi transformado
num desejo de obedecer, e o pecador se rende à influencia persuasiva
da Palavra pela operação do Espírito Santo. Esta é
a vocação eficaz.
A vocação eficaz, ela é ao mesmo tempo passiva e ativa
no homem. Ela é ativa no sentido de o homem responder a ela com arrependimento
e fé, ambos frutos da regeneração. Embora sejam dons
de Deus ao homem, Deus não pode exercer fé e arrependimento.
Mas o homem também não o pode se Deus não operar nele.
Esse é o aspecto passivo.
Então, o homem é justificado e segue-se o processo de santificação,
que também envolve um aspecto passivo e outro ativo. Depois a glorificação.
O grande resumo destas doutrinas esta expresso em Rm 8:28-30. Veja que é
dada como certa a perseverança até o final. Embora possamos
cair em pecado, Deus vai de tal modo agir em nosso coração
que voltaremos para Ele. Aqui, é importante lembrar que isto não
é desculpa para cairmos e pensar assim só mostra que nunca
nascemos de novo. O verdadeiro crente tem o desejo de estar sempre ao lado
do Senhor e confirmar sua vocação e eleição
(II Pe 1:10).
Podemos também aqui chegar a algumas conclusões:
- A eleição de Deus é antes da fundação
do mundo e não envolve nada que há no pecador. Deus elegeu
incondicionalmente, por causa de Seu amor. Se não fosse assim,
nenhum de nós teria sido eleito, pois somos todos pecadores e não
há nada que nos faça melhor do que os outros homens. Por
isto, este tipo de eleição não pode ser considerado
acepção de pessoas, pois ela não é baseada
em algum mérito que tivéssemos perante Deus (boas-obras,
fé, etc.).
- A eleição não é a salvação
(como afirmam os hiper-calvinistas), mas é para a salvação.
Entre as duas está todo o processo descrito anteriormente.
- Deus não nos obriga a nada. Sua graça é irresistível
porque Sua obra é completa. Ele age em nosso coração
mudando a nossa natureza. Ele nos atrai com sua benignidade e seu amor
e conquista nosso coração (Jr 31:3), de maneira tal que
vamos livremente para Ele, respondendo com fé e arrependimento.
- Não podemos cair no erro dos hiper-calvinisas que dizem que
não há necessidade de pregação da Palavra
e enfatizam tanto a soberania de Deus que se esquecem da responsabilidade
humana. A Palavra deve ser pregada por dois motivos: foi uma ordem dada
por Jesus e é o meio que Deus usa para atingir seus eleitos. Porque
Deus assim o quis não sabemos e não nos cabe questioná-lo.
Sabemos tão somente que Ele assim o quis e portanto, assim devemos
fazer. A segunda observação poderíamos resumir em
uma frase: "A soberania de Deus e a soberania do homem certamente são
incompatíveis. Mas, a soberania de Deus e a responsabilidade humana,
não". O homem é responsável e a Bíblia afirma
isto, sendo incontestável este fato. Porque não compreendemos
ambos os fatos não quer dizer que estes não sejam verdadeiros.
Precisamos buscar o equilíbrio em Deus e em Sua Palavra. Mas devemos
nos lembrar que ser responsável não significa necessariamente
ter livre-arbítrio. Deus não nos obriga a nada, mas controla
tudo. Embora não seja possível explicá-las totalmente,
isto não significa que elas não sejam verdadeiras.A nossa
motivação para a pregação não deve
ser porque Jesus mandou e sim por amor ao Mestre, pois o Seu amor nos
constrange. Se este amor não for suficiente para o nosso constrangimento
nada o será. E lembremos que estamos levando a mensagem mais poderosa
do Deus todo-poderoso, pois "é o poder de Deus para a salvação
de todo aquele que crê." (Rm 1:16).
- Nota-se claramente a diferença do conceito sobre a onipotência,
entre o calvinismo e o arminianismo. No calvinismo, o termo é entendido
ao pé-da-letra. Deus pode fazer tudo aquilo que, em Sua perfeita
sabedoria e vontade, Ele deseja fazer. Isso não quer dizer que
Ele pode fazer literalmente tudo. Deus não pode cessar de ser Deus.
Porém tudo que quer e promete, Ele fará.
- No calvinismo, vemos o quanto o homem é realmente pecador. A
queda não é apenas uma doença, um mal espiritual,
mas sim um desastre e significa a morte. A eleição é
realmente eleição por parte de Deus e não apenas
Sua ratificação sobre algo que Ele previu no homem. A expiação
é realmente expiação, pois Cristo veio para garantir
salvação para o Seu povo, veio garantir esta benção
para Seu povo e não apenas tornar possível a salvação,
redimindo de fato o povo eleito. A salvação é realmente
pela graça, pois independe de qualquer esforço de nossa
parte. E a vida eterna é realmente eterna, pois nunca poderá
ser perdida.
Que Deus abençoe a cada irmão e que Ele se agrade de aplicar
a Sua verdade a cada um de nós. Amém.
Autor: Carlos Henrique
Fonte: www.palavraprudente.com.br