A Causa de Deus e A Verdade - Parte I - John Gill D.D.

SEÇÃO 45 - I TIMÓTEO 2:4

“Que quer que todos os homens se salvem, e venham ao conhecimento da verdade.”

A

CAUSA DE DEUS E A VERDADE

PARTE 1

SEÇÃO 45 - I TIMÓTEO 2:4, “Que quer que todos os homens se salvem, e venham ao conhecimento da verdade.”

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Essas palavras são usadas muitas vezes para opor-se ao decreto da reprovação de Deus e em favor da redenção universal, mas se as usam com sucesso será visto quando for observado:

1. A salvação que Deus aqui deseja que todos os homens desfrutem não é uma mera possibilidade de salvação para todos, nem para colocar todos os homens num estado de quase obtê-la, nem uma oferta de salvação a todos, nem uma proposta de dar meios suficientes dessa salvação a todos em Sua Palavra. Isso é uma declaração de um desejo de Deus por uma salvação real, certa e genuína, que Ele tem determinado que os homens devam ter, uma que Ele tem proporcionado e assegurado na Sua aliança de Sua graça e enviou Seu Filho ao mundo para realizá-la,e Este a tem realizado completamente .

2. A vontade de Deus que todos os homens sejam salvos, não é uma vontade condicional ou será uma que depende da vontade do homem ou de qualquer coisa a ser realizada pelo homem? Pois, se este fosse o caso, ninguém poderia ser salvo; e se alguém deve der salvo pelos seus próprios meios, tal salvação seria do que quer, e do que corre, e não de Deus, que se compadece, ao contrário das palavras expressas da Escritura (Romanos 9:16.), mas essa vontade de Deus, acerca da salvação dos homens, é absoluta e incondicional, uma vontade que infalivelmente a garante e a produz. Não é tal vontade como é distinguível no antecedente e consequente com a primeira das quais é dito que Deus deseja a salvação de todos os homens porque eles são Suas criaturas e obra de suas mãos; com a última Ele a deseja ou não, de acordo com a conduta futura e comportamento do homem. Mas a vontade de Deus, relacionada à salvação do homem, é uma vontade completa, uma vontade invariável, inalterável e imutável. Mas, se Ele resolveu alguma coisa, quem então o desviará? O que Sua alma quiser, isso fará (Jó 23:13). Também não é meramente Sua vontade de aprovação ou complacência, sendo apenas expressão do que Lhe agrado ou que é considerada boa a Ele; mas é o Seu decreto, conforme o Seu propósito, é uma vontade determinante, que nunca é frustrada, mas é sempre cumprida. Eu sei que é observado por alguns, que não é dito que Deus ‘swsai’ salvará todos os homens, implicando o que o homem faria; mas que Ele teria a todos os homens ‘swthenai’ para ser salvos, significando que estes devem buscar a salvação, e usar todos os meios para a obtenção dela, que, quando realizada, é agradável a Ele. Contudo, o outro sentido deve ser abundantemente preferido.

3. Que todos os homens a quem Deus gostaria que fossem salvos, são aqueles que Ele também teria de conduzir ao conhecimento da verdade; isto é, não a uma simples concordância, mas um conhecimento experimental do Evangelho de Jesus Cristo, como o caminho, a verdade e a vida, ou seja, do verdadeiro caminho da vida e da salvação por Ele. E todos os salvos por Deus são trazidos pelo Seu Espírito e por Sua graça a uma familiaridade com essas coisas, que são um ato de Sua vontade soberana e um caso característico de Seu favor. Mesmo que Ele que ocultaste estas coisas aos sábios e entendidos, e as revelaste aos pequeninos. Sim, ó Pai, porque assim te aprouve (Mateus 11:25, 26). Então:

4. Não devemos entender cada indivíduo da humanidade por todos os homens a quem Deus quer salvar, uma vez que essa não é a vontade dEle que todos os homens, neste amplo sentido, devem ser salvos; pois é Sua vontade que alguns homens sejam condenados, muito justamente, por seus pecados e transgressões. Estes são homens ímpios, que já antes estavam escritos para este mesmo

juízo (Judas 1:4) e a quem será dito: apartai-vos de mim, malditos, para o fogo eterno. Além disso, se fosse a vontade de Deus que cada indivíduo da humanidade devesse ser salvo, então cada um seria salvo; porquanto, quem tem resistido à sua vontade? Ou pode fazê-lo? Ele não faz segundo a Sua vontade com o exército do céu e os moradores da terra? (Romanos 9:19; Daniel 4:35; Efésios 1:11).

Não é verdade que Ele faz todas as coisas, segundo o conselho da sua vontade? Sendo assim, é certo que todos os homens, nesse amplo sentido, não são salvos, pois alguns irão para o tormento eterno, mas os justos para a vida eterna (Mateus 25:46). Além disso, as mesmas pessoas que Deus quer que sejam salvas, estas mesmas, Ele teria que fazê-las chegar ao conhecimento da verdade; mas essa vontade não é em relação a cada indivíduo da humanidade. Se fosse Sua vontade, Ele sem dúvida, daria a cada homem os meios para isso, o que Ele não fez, nem fará. Por muitas centenas de anos, ele deixou andar todas as nações em seus próprios caminhos, não tendo em conta os tempos da ignorância. Mostrou a sua palavra a Jacó, os Seus estatutos e os Seus juízos a Israel. Não fez assim a nenhuma outra nação; e quanto aos Seus juízos, não os conhecem (Atos 14:16; 17:30; Salmos 147:19, 20). Para muitos a quem o Evangelho é pregado, Ele está escondido; alguns se entregaram às fortes ilusões para acreditar numa mentira, e poucos são familiarizados salvífica e experimentalmente com a verdade como ela é em Jesus.

5. Existem de fato muitas coisas incitadas em favor deste amplo sentido da frase todos os homens.

1. Como a exortação do apóstolo, no versículo 1, que se façam deprecações, orações, intercessões, e ações de graças, por todos os homens. Contudo, certamente, por todos os homens, não significa cada indivíduo, isto é, ser humano, sem exceção, que está ou estará no mundo. Milhões de homens estão mortos e já se foram, para os quais a oração não deve ser feita. Muitos no inferno, aos quais, ela não seria de proveito algum; e muitos no céu, que não têm necessidade disso. Nem devemos orar pelos que têm cometido pecado para a morte. (1 João 5:16). Além de ação de graças, bem como orações, deveriam ser feitas por todos os homens; mas certamente que o significado do apóstolo não é que os santos devem dar graças por homens maus, e perseguidores, e particularmente por um Nero perseguidor; nem por hereges ou falsos mestres, tais como Himeneu e Alexandre, os quais Ele entregou a Satanás. A frase deve, portanto, ser tomada num sentido limitado e restrito. Isso quer dizer por alguns apenas, como aparece do versículo 2, pelos reis, e por todos que estão em eminência; isto é, por homens da mais elevada, bem como da mais baixa ordem e posição.

2. Este sentido é defendido, a partir da razão dada no versículo 5, porque há um só Deus, “que é o Deus de todos, o Pai comum e Criador de todos os homens.” Agora, “é dito, assim que Ele é o Deus de todos os homens em particular; e assim este argumento deve mostrar que Ele deveria ter todos os homens em particular, para serem salvos." Para qual pode ser respondido que Deus é o Deus de todos os homens, como o Deus da natureza e da providência, mas não como o Deus da graça, ou de uma forma de aliança, pois então Ele não distinguiria favor ou felicidade entre qualquer povo, que o Senhor é o Seu Deus; de fato há um só Deus e Pai de todos, o qual é sobre todos, e por todos e em todos vós, significando os crentes, a quem o apóstolo escreve; (Efésios 4:6; Romanos 10:12) porque um mesmo,

é o Senhor de todos, rico para com todos os que o invocam.

3. Isso é argumentado a partir de um só Deus, e um só Mediador entre Deus e os homens, Jesus Cristo homem; mas deve ser observado que Ele não é mencionado como o Mediador entre Deus e todos os homens, e muito menos para cada homem individualmente. Desde que Ele é expressamente chamado de, o Mediador de uma nova aliança, (Hebreus 12:24) Ele só pode ser um Mediador para os que pertencem a esta aliança. Além disso, deve ser claro que Ele não tem realizado os diversos ramos de Seu ofício mediatório, a oblação de Si mesmo na cruz, e a Sua intercessão no céu, para cada homem. E embora a natureza que Ele assumiu seja comum a todos os homens, foi dotada com o melhor dos sentimentos humanos, e sujeita à lei comum da humanidade. Contudo, já que foi assumida com uma visão peculiar aos eleitos de Deus, a semente de Abraão, eles compartilham todas as bênçãos peculiares e favores decorrentes da assunção de tal natureza.

4. É observado que Cristo é mencionado no versículo 6, como o qual que se deu a Si mesmo em preço de redenção por todos, que é entendido de todos os homens em particular. Mas deve ser observado também, que esta redenção é ‘ajntilutron uper pantwn’, ou seja, uma redenção vicária, substituída em lugar de todos, por meio do qual um preço total foi pago para todos, e uma plena satisfação feita pelos pecados de todos, o que não pode ser verdade de cada homem individualmente, pois assim nenhum homem poderia ser justamente condenado e punido. O sentido dessas palavras é melhor compreendido por aquilo que Cristo mesmo disse: O Filho do homem não veio para ser servido, mas para servir, E para dar a sua vida em resgate de muitos (Mateus 20:28). Assim, a palavra Hebraica ‘lk’ todos, a qual esta se compara, às vezes significa muitos, uma multidão; e, por vezes, apenas uma parte de uma multidão, como Kimchi observou. Portanto,

5. é melhor entender por todos os homens alguns de todos os tipos, como Austin fez há muito tempo, e é o sentido em que a palavra tudo deve ser considerada em muitos lugares; como em Gênesis 7:14; Mateus 4:23, 24; Joel 2:28. Esse é o significado dela no versículo 1 e concorda bem com o contexto. Desde que Cristo redimiu alguns de todas as nações, alguns de toda a tribo, povos e línguas; e Deus salva e chama alguns de todas as classes e qualidades, como reis e camponeses: de cada estado e condição, como ricos e pobres, escravos e livres; de sexo, masculino e feminino; de todas as idades, jovens e velhos, e todos os tipos de pecadores, grandes e pequenos. É dito realmente, que, de acordo com essa limitação e sentido das palavras, Deus está disposto que alguns de todos os tipos e pessoas sejam salvos; pode ser dito mais verdadeira e propriamente, que Deus deseja que todos os homens sejam condenados, e que Cristo morreu por ninguém; já que aqueles por quem Ele morreu são nada, de acordo com essa doutrina, comparativamente ao maior número por quem Ele não morreu. Ao que eu respondo, não compete a nós dizer o que poderia ser mais verdadeiro e propriamente dito por Deus, ou um escritor inspirado. No entanto, isto é certo, que todo o mundo está no maligno, (1 João 5:19) assim existe um mundo que deve ser condenado; o que concorda com o que o apóstolo Paulo diz em tantas palavras, que o mundo deve ser condenado. Somos repreendidos pelo Senhor, para não sermos condenados com o mundo (I Corinthians 11:32). Além disso, embora aqueles por quem Cristo morreu sejam poucos comparativamente, contudo eles não podem ser classificados, num sentido comparativo, ou em qualquer sentido, como ‘ninguém’; e de fato, quando considerados por eles mesmos, trata-se de um número que nenhum homem pode contar. Contudo,

6. prefiro pensar que por todos os homens se refere aos Gentios, que são, por vezes, chamados de o mundo, o mundo inteiro, e cada criatura, Romanos 11:12, 15; 1 João 2:2; Marcos 16:15. Esse é o sentido que eu percebo que ela é usada no versículo 1, onde o apóstolo exorta que se façam deprecações, orações, intercessões, e ações de graças, por todos os homens, pelos reis, e por todos os que estão em eminência. Tal prática, que era contrário a uma noção que foi praticada entre os judeus, dos quais existiam muitos nas igrejas primitivas, que eles não deviam orar por pagãos e magistrados pagãos. O apóstolo reforça esta exortação a partir da vantagem que se voltaria para eles mesmos; para que tenhamos uma vida quieta e sossegada, em toda a piedade e honestidade. Além disso, ele diz: Isto é bom e agradável diante de Deus nosso Salvador, que quer que todos os homens, gentios, assim como os judeus, se salvem, e venham ao conhecimento da verdade, e, portanto, enviou Seus ministros para pregar o Evangelho entre eles. A doutrina da graça de Deus se há manifestado, trazendo salvação a estes todos os homens, a fim de levá-los a isto; pois há um só Deus dos judeus e gentios, que, por Seu Evangelho, tirou deste último um povo para o Seu nome e Sua glória; e há um só Mediador entre Deus e os homens, Jesus Cristo homem, que, não igual a Moisés, que era o Mediador somente para os judeus, mas também para os gentios, e esta se tornou a nossa paz (Efésios 2:14-18), o qual de ambos os povos fez um; e pela cruz reconciliou ambos; evangelizou a paz, a vós que estáveis longe, e aos que estavam perto; porque por ele, ambos temos acesso ao Pai em um mesmo Espírito; o qual se deu a si mesmo em preço de redenção por todos, para redimir os gentios bem como judeus, que era para servir de testemunho a seu tempo para eles, como foi para o apóstolo, que acrescenta: para o que (digo a verdade em Cristo, não minto) fui constituído pregador, e apóstolo, e doutor dos gentios na fé e na verdade, e então conclui: Quero, pois, que os homens orem em todo o lugar, isto é, não se limitem ao templo para a oração pública. Esta era outra noção e prática judaica, levantando mãos santas, sem ira nem contenda. Percebendo então que existem algumas noções judaicas apontadas no contexto, e todo ele é adaptado para o estado e caso dos gentios, sob a dispensação do Evangelho, existe uma boa dose de razão para concluir que eles estão aqui designados. Por meio desse contexto outro princípio dos judeus é refutado: Que os gentios não deveriam receber qualquer benefício pelo Messias quando Ele veio; e é a razão verdadeira da maioria, se não de todos, aquelas expressões universais, relacionados com a morte de Cristo, que nós encontramos nas Escrituras.

Do todo, uma vez que essas palavras não podem ser entendidas como se referissem a cada homem individualmente, não se deve pensar nelas militando contra o justo decreto da reprovação de Deus, nem para manter e apoiar a redenção universal.

 

Autor: John Gill,D.D.
Tradução: Hiralte Fontoura 09/2012
Revisão: Calvin G Gardner, 06/2014
Revisão gramatical: Erci Nascimento 10/2014
Fonte: www.PalavraPrudente.com.br